Um espírito que caminha pelo mundo.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Por Adeir Ferreira

Imagem: Jornal de Londrina


Em situações trágicas a minha avó dizia: "esse é o fim dos tempos".

Eu não gozo de envergadura cronológica como minha finada avó ao andar por este mundo, e nem galgo  rígida teoria histórica para avaliar os sinais da situação política do país. Mas eu também devo repetir o jargão da minha avó, "estamos mesmo no fim dos tempos". Acrescento que a minha prematura inquietação emenda esse sadio pensamento: "também estamos no início de um novo tempo". Eis um grande paradoxo existencialmente kierkegaardiano.

Certamente meus alunos e o público em geral que acompanha meus simplórios escritos devem comentar entre si, "esse filósofo é mesmo um partidarista confesso". Parafraseando o Mano Brown, vocalista dos Racionais Mc's, eu não sou um petista, mas um questionador, pois me estremece os ossos só de ver a insalubridade cultural-política-ética-intelectual em que o país mergulhou. Me apavora, por exemplo ver um grande números de letrados, profissionais de respeito sucumbir ao peso da irracionalidade. Aliás, me assombra ver o poço de ignorância que emergiu da alma dos brasileiros. E nesse sentido eu devo confessar que eu também sou emerso desse novo fenômeno. É também por vir à tona essa lama espiritual que eu nasci enquanto filósofo. É também por causa desse fenômeno que muitos homens morreram intelectualmente.

Ao meditar acerca de O Zaratustra, lido no início da minha graduação eu fiquei fascinado com essa obra. No fundo, o meu encanto era meramente pela paixão com que Nietzsche escrevia. Meu encanto girava em torno das peripécias do profeta filosofante. Eu não tinha um espírito profundo para entender Zaratustra. Mesmo que seja vagamente, agora eu sei o drama de Nietzsche numa Alemanha pré-nazista, cuja cultura subjetivizante e tenebrosa o filósofo pressentia com um século de antecedência. Talvez seja também um desses motivos de Nietzsche ser extemporâneo.

Devo também esclarecer o drama intelectual que é tentar discutir com uma massa, cujo tipo de razão operante seja a instrumental, conforme Adorno e Horkheimer. Atualmente, a razão crítica ou filosófica é uma raridade. Não posso tiranizar o público que goza legalmente de liberdade de expressão, mas deveria também ser legalmente proibida a liberdade de alienação em que as grandes mídias impetram na alma desses homens. Eu não posso me declarar petista até mesmo por não dominar profundamente o conhecimento político e nem histórico, mas procuro refletir, racionar, dialogar, analisar. Essas habilidades estão em falta nos espíritos rasos, pois reduziram sua essência reflexiva à capacidade de receber e repassar informações fabricadas ideologicamente, como se verdades fossem.
Graças a esse cisma político fagulhado pelo esquerdismo é que muitas mentes adormecidas, doentes, apáticas ressurgiram dos mortos, inclusive a minha. Graças a esse fenômeno sentido pelos senhores burgueses que podemos enxergar e farejar a superficialidade do espírito desses homens medíocres. É também graças a ditadura que muitos artistas, muitos intelectuais se firmaram e fizeram belas músicas. Além de homens, rasos em espírito vejo também nas instituições, sobretudo aquelas que eu nutria profundo respeito, a imensa podridão dos seus brilhosos candelabros, de suas luminosas telas, de suas duras carteiras, de suas silenciosas casernas, de suas elevadas tribunas.

Não é por causa do PT que nós - mentes sãs - arrumamos inimizades, mas sim por causa de um novo modo de governar que nossos inimigos arrancaram as suas centenárias máscaras. Eu sou sincera e profundamente grato a essas figuras bizarras como o Moro, o Aécio, o Joaquim Barbosa, o Bolsonaro, o Feliciano, o Cunha, a Rede Globo e toda a corja, porque agora temos nomes concretos para justificar as nossas centenárias e silenciosas indignações. No entanto, por outro lado, temos uma massa revoltosa, inculta, dogmática que reverbera um mar de ódio. Sabe quando você está encolerizado e quer matar o atendente de telemarketing? 

Esse sentimento de revolta é um impulso comum do ser humano contemporâneo. Mas, é também muito comum que você simplesmente esteja encolerizado, com profundo ódio, mas lhe falte razão, entendimento, diálogo. É esse o problema do povo simples, a irascividade. Simples no sentido etimológico da palavra, ou seja, pobre de espírito. Além desse ódio cego existe um responsável oculto no fabrico desses zumbis, a grande mídia. Pois é ela quem injeta o sentimento imbecil do raivoso com mentiras, com farsas, com conjecturas capazes de envenenar até mesmo pessoas aparentemente inteligentes.

Eu não posso arrogar para mim o título de referência em capacidade crítica, muito menos de uma voz que fale por todos, mas sim o espírito do Super Homem de Nietzsche. Ou seja, aquela voz que clama no deserto, aquele espírito que caminha pelo mundo, aquela palavra que concita à sanidade. Muitos espíritos egoicamente rasos têm se promovido às custas da desgraça alheia, vendo no telespectador uma forma de escravizá-lo, de dominá-lo, de ser-lhe um super-herói, de impressioná-lo. Eu, porém, digo que não tem como ver uma lama de irracionalidade tomar conta do mundo sem soar o sinal de emergência. Eu não sou a lama, nem o sinal e nem o salva-vidas, sou apenas um espírito que caminha pelo mundo como uma testemunha, conforme Osho.

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